- Forest Insights
Perda florestal permanece resistentemente alta em 2021
Fire in forest in Kalimantan, Indonesia. Photo by Rini Sulaiman / CIFOR
-Rini Sulaiman/Norwegian Embassy
Os trĂłpicos perderam 11,1 milhões de hectares de cobertura arbĂłrea em 2021, de acordo com novos dados da Universidade de Maryland divulgados no Global Forest Watch. Â
De particular preocupação sĂŁo os 3,75 milhões de hectares de perda que ocorreram nas florestas tropicais primárias – áreas de importância crĂtica para o armazenamento de carbono e biodiversidade – equivalente a uma taxa de 10 campos de futebol por minuto. A perda de florestas primárias tropicais em 2021 resultou na emissĂŁo de 2,5 Gt de diĂłxido de carbono, o equivalente Ă emissĂŁo anual de combustĂveis fĂłsseis da ĂŤndia.Â
Perda de floresta tropical primária, 2002-2021Â
A taxa de perda de floresta primária nos trĂłpicos tem sido resistentemente consistente ao longo dos Ăşltimos anos. Embora os trĂłpicos tenham perdido 11% menos floresta primária em 2021 do que em 2020, isso seguiu um aumento de 12% de 2019 a 2020, principalmente devido a um aumento na perda relacionada a incĂŞndio. Â
E nĂŁo sĂŁo apenas as florestas tropicais que preocupam. As florestas boreais – principalmente as da RĂşssia – sofreram uma perda de cobertura arbĂłrea sem precedentes em 2021, em grande parte impulsionada por incĂŞndios.Â
Essas tendĂŞncias ressaltam quanta ação será necessária para atingir as metas globais de desmatamento zero. Sob a Declaração dos LĂderes de Glasgow de 2021 sobre Florestas e Uso da Terra, 141 paĂses se comprometeram a coletivamente “interromper e reverter a perda florestal atĂ© 2030”. A realização desse compromisso exigirá um declĂnio consistente na perda de florestas a cada ano pelo resto da dĂ©cada – um declĂnio que ainda nĂŁo está acontecendo nos trĂłpicos como um todo. As exceções sĂŁo alguns paĂses selecionados, principalmente IndonĂ©sia e Malásia, onde a perda de florestas primárias diminuiu significativamente nos Ăşltimos anos, e paĂses como GabĂŁo e Guiana, que perderam 1% ou menos de suas florestas primárias nas Ăşltimas duas dĂ©cadas.Â
Os 10 paĂses onde mais se perdeu florestas tropicais primárias em 2021Â
A seguir, um olhar aprofundado sobre algumas tendĂŞncias da perda de florestas em 2021:Â
IndonĂ©sia reduziu a perda de floresta primária pelo quinto ano consecutivoÂ
A taxa de perda de florestas primárias na IndonĂ©sia continuou a diminuir em 2021 pelo quinto ano consecutivo, caindo 25% em relação a 2020. Mais um ano de declĂnio Ă© motivo de comemoração e indica que a IndonĂ©sia está caminhando na direção certa para cumprir alguns de seus compromissos climáticos. No ano passado, a IndonĂ©sia atualizou seu plano climático nacional (NDC) com o compromisso de reduzir as emissões em seu setor florestal e de uso da terra, de modo que se torne um sumidouro lĂquido de carbono atĂ© 2030. Â
Perda de floresta primária na IndonĂ©sia, 2002 a 2021Â
A continuidade da tendĂŞncia de queda tambĂ©m indica que os compromissos corporativos e as ações governamentais estĂŁo dando certo. Novas pesquisas mostram que o desmatamento ligado ao Ăłleo de palma está no menor nĂvel em 20 anos. Os compromissos No Deforestation, No Peat and No Exploitation (sem desmatamento, sem turfa e sem exploração, NDPE) agora cobrem 83% da capacidade de refino de Ăłleo de palma na IndonĂ©sia e na Malásia, e mais de 80% da indĂşstria de papel e celulose na IndonĂ©sia. AlĂ©m disso, a Roundtable on Sustainable Palm Oil (Mesa Redonda para Ă“leo de Palma Sustentável) reforçou as exigĂŞncias para certificação sustentável em 2018, incluindo o banimento de desmatamento ou remoção de turfas. Â
O declĂnio tambĂ©m reflete os esforços do governo indonĂ©sio para reduzir a perda de florestas. O MinistĂ©rio do Meio Ambiente e Florestas aumentou as ações de monitoramento e prevenção do fogo apĂłs os incĂŞndios florestais e de turfa generalizados em 2015. O governo tambĂ©m emitiu uma moratĂłria permanente sobre a conversĂŁo de florestas primárias e turfeiras e ampliou o mandato da AgĂŞncia de Restauração de Turfas para incluir proteção e restauração de manguezais e turfeiras. Os manguezais sĂŁo ecossistemas importantes para a biodiversidade e para a regulação dos impactos do clima extremo. Â
Embora a IndonĂ©sia tenha motivos para comemorar o quinto ano consecutivo de declĂnio da perda florestal, precisará reforçar as medidas de proteção florestal para sustentar essa tendĂŞncia positiva. Os preços do Ăłleo de palma, que tendem a se correlacionar com o desmatamento, começaram a subir em 2020 e agora estĂŁo no maior nĂvel dos Ăşltimos 40 anos. O congelamento temporário de licenças para novas plantações para produção de Ăłleo de palma nĂŁo foi renovado no ano passado, abrindo as portas para a expansĂŁo das plantações em resposta ao aumento dos preços. Â
AlĂ©m disso, o governo indonĂ©sio revogou recentemente centenas de licenças para operações madeireiras, plantações e atividades de mineração em áreas florestais. Se essas áreas forem redistribuĂdas Ă s comunidades locais e indĂgenas para o manejo florestal comunitário, as revogações poderĂŁo ser um marco importante no caminho para um reconhecimento mais forte dos direitos consuetudinários e da proteção florestal. No entanto, tambĂ©m existe a possibilidade de que essas áreas sejam realocadas para empresas e desmatadas rapidamente, levando a mais perdas florestais. Â
Por fim, existe o risco de que os esforços da IndonĂ©sia para impulsionar a recuperação econĂ´mica da pandemia de COVID-19 ainda possam afetar suas florestas. Â
Novas fronteiras de desmatamento emergem na AmazĂ´nia brasileiraÂ
Como o paĂs com a maior floresta tropical primária, o Brasil consistentemente lidera a lista de maior perda de floresta primária. Mais de 40% da perda de floresta primária tropical em 2021 ocorreu no Brasil, um total de 1,5 milhĂŁo de hectares.Â
Perda de floresta primária no Brasil, 2002-2021Â
A taxa de perda de florestas primárias no Brasil tem sido persistentemente alta nos Ăşltimos anos. A perda relacionada a incĂŞndios flutuou dependendo do nĂvel de queimadas fora de controle, mais recentemente com um pico em 2020 na AmazĂ´nia e no Pantanal. Enquanto isso, as perdas nĂŁo relacionadas a incĂŞndios, que no Brasil sĂŁo mais frequentemente associadas Ă expansĂŁo agrĂcola, aumentaram 9% de 2020 a 2021. Essa descoberta Ă© consistente com o sistema de monitoramento oficial do Brasil, PRODES (leia mais sobre os conjuntos de dados da Universidade de Maryland e PRODES aqui), que descobriu que 2021 teve a maior taxa de desmatamento raso na AmazĂ´nia desde 2006, quando as medidas foram implementadas para reduzir drasticamente o desmatamento. Â
A AmazĂ´nia ocidental brasileira, em particular, enfrentou uma intensificação da perda de florestas primárias, com seus principais estados experimentando aumentos superiores a 25% na perda nĂŁo causada por incĂŞndio de 2020 a 2021. Esta parte da AmazĂ´nia tem vários hotsposts de perda de floresta primária, o que significa lugares que experimentaram uma aparĂŞncia estatisticamente significativa de novas perdas em 2021. Muitas das novas áreas prioritárias abrangem clareiras em grande escala – provavelmente para pastagens de gado – ao longo das estradas existentes. Algumas dessas estradas, como a BR-319 que segue de norte a sul no Amazonas, estĂŁo previstas para pavimentação e melhorias, o que já resultou em um aumento no desmatamento. Â
A perda de floresta primária no Brasil Ă© especialmente preocupante, dada a nova evidĂŞncia de que a floresta amazĂ´nica está perdendo resiliĂŞncia e pode estar mais perto de um ponto de inflexĂŁo do que se pensava anteriormente, onde as interações entre desmatamento, mudanças climáticas e incĂŞndios levam Ă transformação irreversĂvel de grandes áreas da AmazĂ´nia para uma savana. Isso nĂŁo apenas resultaria em grandes quantidades de perda de biodiversidade e emissões de carbono, mas tambĂ©m interromperia os padrões de precipitação crĂticos para a produção agrĂcola.Â
BolĂvia experimentou uma perda recorde de florestas primárias devido a incĂŞndios e agricultura em larga escalaÂ
A perda de floresta primária na BolĂvia atingiu seu nĂvel mais alto já registrado em 2021, com 291 mil hectares, superando a IndonĂ©sia mais uma vez e tendo a terceira maior perda de floresta primária entre os paĂses tropicais.
Perda de floresta primária da BolĂvia, 2020-2021
Os Ăşltimos trĂŞs anos viram taxas consistentemente altas de perda na BolĂvia, com os incĂŞndios representando mais de um terço da perda a cada ano. Assim como nos dois anos anteriores, em 2021 houve queima significativa de florestas primárias dentro de áreas protegidas. IncĂŞndios na BolĂvia sĂŁo quase sempre provocados por humanos como parte dos esforços para limpar a terra, mas se espalham fora de controle devido ao clima seco e quente exacerbado pelas mudanças climáticas. A maioria das queimadas em 2021 ocorreu no departamento de Santa Cruz, embora o governo esteja trabalhando para restaurar as áreas afetadas.Â
Santa Cruz tambĂ©m Ă© o epicentro da agricultura em grande escala do paĂs, como soja e pecuária, que responde por grande parte da perda de florestas primárias nĂŁo causadas por incĂŞndios em 2021. Embora a BolĂvia tenha muito menos produção de soja do que os paĂses vizinhos, a maior parte de sua expansĂŁo de soja ocorreu Ă s custas das florestas.Â
Agricultura, demandas de energia e extração madeireira levaram Ă perda de florestas primárias nas florestas da Bacia do CongoÂ
Como nos anos anteriores, as altas taxas persistentes de perda de florestas primárias continuaram na RepĂşblica Democrática do Congo (RDC). A RDC perdeu quase meio milhĂŁo de hectares de floresta primária em 2021 devido Ă expansĂŁo da agricultura de pequena escala e Ă colheita de árvores para atender Ă s demandas de energia. Â
As grandes extensões florestais da RDC sĂŁo um sumidouro de carbono globalmente importante, com vastas extensões de turfeiras ricas em carbono. Grandes mudanças sĂŁo necessárias para conter essa alta taxa de perda persistente, incluindo caminhos de desenvolvimento que nĂŁo envolvam expansĂŁo agrĂcola em florestas primárias e fornecendo Ă s comunidades urbanas e rurais acesso a energia limpa acessĂvel para reduzir a dependĂŞncia de carvĂŁo e outras formas de energia de madeira.Â
Apesar das altas taxas de perda persistentes na RDC, sinais de esperança podem ser encontrados na Bacia do Congo. Tanto o GabĂŁo quanto a RepĂşblica do Congo experimentaram dois anos de declĂnio na perda de florestas primárias. Ambos sĂŁo reconhecidos como paĂses de high forest, hige deforestation (alta floresta e baixo desmatamento, HFLD) com desenvolvimentos promissores no horizonte para suas florestas: o GabĂŁo tornou-se o primeiro paĂs africano a receber pagamento pela redução das emissões de carbono e desmatamento, e a RepĂşblica do Congo recentemente aprovou uma lei permitindo que Povos IndĂgenas e Comunidades Locais (IPLCs) detenham e administrem legalmente – e assim protejam – suas florestas de atividades comerciais indesejadas. Â
Mudanças climáticas causaram estragos nas florestas do norteÂ
Fora dos trĂłpicos, as florestas boreais experimentaram as maiores taxas de perda de cobertura arbĂłrea em 2021. Embora a perda de cobertura arbĂłrea nas florestas boreais raramente resulte em desmatamento permanente, a taxa de perda atingiu nĂveis sem precedentes em 2021, aumentando 29% em relação a 2020. Essas florestas perenes de alta latitude estĂŁo cada vez mais ameaçadas pelas mudanças climáticas, com condições mais quentes e secas levando ao aumento de incĂŞndios e danos causados por insetos.Â
Perda de cobertura arbĂłrea por domĂnio climáticoÂ
Uma temporada de incĂŞndios sem precedentes na RĂşssia impulsionou grande parte desse aumento. A RĂşssia passou pela pior temporada de incĂŞndios desde o inĂcio dos registros em 2001, com mais de 6,5 milhões de hectares de perda de cobertura arbĂłrea em 2021. Embora os incĂŞndios sejam uma parte natural dos ecossistemas florestais boreais, incĂŞndios maiores e mais intensos sĂŁo preocupantes. O clima mais quente e seco relacionado Ă s mudanças climáticas levou a condições propensas ao fogo, turfeiras mais secas e gelo permanente do subsolo derretido. A vasta área de turfeiras da SibĂ©ria – a maior do mundo – armazena grandes quantidades de carbono, que Ă© liberado na atmosfera quando a turfa seca. O derretimento do gelo permanente do subsolo tambĂ©m libera carbono e metano armazenados. Essas condições podem representar um novo normal, impactando as pessoas que vivem na SibĂ©ria e criando um ciclo de feedback no qual o aumento dos incĂŞndios e das emissões de carbono se reforçam e levam ao agravamento das condições. Â
Perda de cobertura arbĂłrea na RĂşssia, 2001-2021Â
O que Ă© necessário para cumprir os compromissos de proteção das florestas?Â
Embora a perda florestal precise diminuir muito mais rápido para atingir as metas de desmatamento zero em 2030, há motivos para esperança. A rápida diminuição da perda de florestas primárias na IndonĂ©sia deve ser celebrada como uma grande conquista que nĂŁo parecia provável apenas cinco anos atrás.Â
Alcançar declĂnios semelhantes em todo o mundo nĂŁo será fácil. A IndonĂ©sia e a Malásia precisarĂŁo manter o Ămpeto na proteção das florestas em meio Ă disparada dos preços do Ăłleo de palma; o Brasil e outros paĂses da AmazĂ´nia precisarĂŁo conter novas áreas prioritárias de desmatamento; os paĂses da Bacia do Congo precisarĂŁo garantir caminhos para o desenvolvimento que protejam as florestas; e a RĂşssia e outros paĂses do norte precisarĂŁo combater os impactos das mudanças climáticas nas florestas. Â
Graças Ă Declaração de Glasgow, o mundo tem um objetivo comum de proteger as florestas e financiamento para apoiá-lo. Os caminhos para alcançar esses compromissos sĂŁo desafiadores, mas claros. Continuaremos a monitorar, analisar e relatar o progresso da humanidade. Â
Leia mais sobre os caminhos para acabar com o desmatamento tropical.
GostarĂamos de agradecer a Svetlana Turubanova e Peter Potapov da Universidade de Maryland, que atualizaram os dados de perda de cobertura arbĂłrea, e Sasha Tyukavina da Universidade de Maryland, que atualizou os dados de perda de cobertura arbĂłrea devido a incĂŞndios.